sexta-feira, 18 de julho de 2008

No tempo de Vieira

Velázquez
1629

No tempo de Vieira

Velasquez
1656

O jogo do Poder:

À primeira vista, Velasquez, um dos maiores pintores de todos os tempos, representou nesta grande tela uma inocente cena da corte.
Aparentemente, tratar-se-á de um retrato de uma infanta. Será assim um tema tão importante que motive tamanha obra?
Na verdade, assistimos a um jogo muito interessante:
O pintor deixa-nos uma visão mais complexa da realidade, pintando diversas personagens e outros elementos simbóloicos em sucessivos planos:
  • Vemos, em primeiro lugar, a infanta rodeada por damas de companhia, por criadas e um cão.
  • Em segundo plano, o próprio pintor. Vemos à sua frente uma tela e nas mãos a paleta e um pincel. Ou seja, afinal também é um auto-retrato.
  • Do lado direito, uns criados ou uns religiosos.
  • Ao fundo, a parede está coberta de quadros. Reproduzem-se à escala diversas obras.
  • Nessa parede, um espelho reflecte duas figuras: são o Rei e a Rainha. Se "reconstruirmos" mentalmente o espaço sugerido pelo autor, naquele momento, estar-se-ia a retratar não a infanta mas o casal numa cena que representa a intimidade da família real. No auto-retrato, o pintor está voltado não para a pequena infanta, mas para o casal real. Eram estes que estariam a ser retratados afinal.
  • Ao fundo, depois de uma porta, subindo umas escadas, espreitando sorrateiramente, talvez um camareiro velando pela família real. A identidade desta personagem é objceto de muitas discussões porque se considera importante para se decifrar o mistério deste quadro. O que estará ele a fazer: a proteger a família real ou a controlá-la?

A corte era a de Filipe IV de Espanha, III de Portugal.

A infanta era sua filha que era, nessa altura, senhor de Portugal e de Espanha, para além de um vasto Império.
Por isso é que o quadro se denomina Las Meninas e não Las Ninas, uma vez que a infanta era portuguesa. Coisas da História...


O quadro encerra, pois, um jogo, em que entra espelhos e tudo (afinal o autor está a representar quem ou o quê?) e uma narrativa (pode-se contar uma pequena história à volta destas personagens).

Pedro Semedo


No tempo de Vieira

BERNINI
Capela Cornaro
Igreja de Santa Maria da Vitória
O espectáculo da Fé

No tempo de Vieira




Praça de S. Pedro do Vaticano

A Igreja de S. Pedro é, estilisticamente, uma obra renascentista, cujo plano se baseia no quadrado e no círculo. Teve, ao longo da sua demorada construção, numerosos planos e outros tantos arquitectos.

Porém, a praça é da autoria de um só: Bernini.
À maneira barroca, preferiu uma geometria mais dinâmica: a elipse neste caso.
Mas a arquitectura também "fala". Neste caso parece que praça, ao formar dois longos braços, quer que os peregrinos que visitam a sede da Igreja, se sintam acolhidos num "abraço" fraternal e, assim, experimentem a sensação de fazerem parte dela.

No Barroco, prefere-se o calor do afecto ao equilíbrio da razão.


No tempo de Vieira


No tempo de Vieira




A FACHADA COMO UMA MÁSCARA


Repare-se na planta da igreja e na estampa que reproduz a fachada.

Imagine-se que chegávamos numa carruagem do século XVIII e observávamos o edifício pela primeira vez. Que sensação nos sugeria?

Em primeiro lugar, o de contemplarmos um edifício de escala esmagadora, sem dúvida.

Também cria uma interrogação perante o seu interior: um único espaço muito amplo (à maneira de S. Pedro do Vaticano) ou uma imensidade de divisões (como o Mosteiro de Mafra ou a Versalhes dos luízes)?

E aquelas colunas altíssimas, o que fazem ali? Uma brincadeira à volta da "coluna de Trajano"?

A gramática clássica também ali está representada: frontão, colunas, cúpula (algo excêntrica, é verdade), etc. A porta de entrada parece a de um templo romano, até tem uma escadaria de acesso a um pequeno "podium".
Contudo, o resto da fachada (torreões e outros elementos) parece abafar e anular de certa forma a entrada à "romana". Ou seja, a gramática arquitectónica "antiga" está presente mas, à boa maneira barroca, os diversos elementos dispõem-se a uma escala monumental e numa subversão da relação entre si, o que nada tem a ver com as regras clássicas da proporcionalidade e do equilíbrio, ainda que mantenha uma certa simetria.
Ou seja, o Barroco também utiliza os referidos elementos mas altera-lhes completamente a relação determinada pelo "módulo" que vinha da Antiguidade e que tinha sido reinterpretado no Reanascimento. O Barroco surge-nos, assim, como uma subversão da ordem.

Entretanto, apeamo-nos da nossa carruagem e dirigimo-nos à igreja.
A escala é sobrehumana. Esmaga-nos.
Há uma contradição entre a linguagem clássica de uns elementos e a imensa massa, aparentemente caótica, dos torreões laterais. Acrescenta-se ainda a excentracidade das colunas (mas que raio fazem aquelas coisas ali?).

Antes da nave, existe um corredor curto, uma espécie de nártex, antecâmara da nave principal e espaço intermediário entre o exterior (o século) e o interior sagrado.
Este espaço é interceptado perpendicularmente por dois outros corredores, um à esquerda e outro à direita.
Espreitemos com curiosidade: que divisões servem estes corredores? Percorramo-los. Afinal descobrimos que não servem divisão alguma!!!! Nada. A não ser umas portas para as traseiras do edifício.

Entramos, finalmente, na nave. É única!!!

Tem umas capelas de cada lado, talvez para sugerir uma amplitude de espaço que a nave não possui.
A nave, elíptica, sugere uma certa profundidade, ampliada pela ábside bastante profunda.

A cobertura é dada por uma abóbada alta, reforçando a sensação de amplitude da nave.
Todos estes elementos são truques que nos induzem a criar uma "experiência sensorial", isto é sugere-nos uma amplitude de espaço que efectivamente não possui. O interior é, na verdade, muito mais pequeno do que nos parece fazer crer. Cria uma ilusão de amplitude através de pequenos truques arquitectónicos e da geometria da sua planta.

Bem vistas as coisas, a fachada também é um logro: promete-nos um interior muito diferente daquele que nos sugere à chegada.
Os tais torreões laterais não servem para outra coisa a não ser criar uma sensação de amplitude. É mais um truque.
A fachada também é uma máscara.
Pedro Semedo

No tempo de Vieira

O DINAMISMO DAS FORMAS IRREGULARES

Templos barrocos com plantas elípticas:
1.Roma: S. Carlos das Quatro Fontes (C. Borromini, 1636-1640)
2.Bécs: Karlskirche (J. B. Fischer von Erlach, 1716-1737)
3.Linz: Templo Carmelita (M. Wittwer, 1713-1738).

No tempo de Vieira


David e Golias, Caravaggio.



CONVENCER PELO HORROR

Em cenas como esta, representando episódios bíblicos, os autores salientavam os aspectos macabros, mostrando ostensivamente o sangue jorrando do golpe, as expressões dos degolados, a atitude resoluta dos personagens: não pode haver piedade para os ímpios.


EGIXIR ADESÃO INCONDICIONAL

A Igreja Católica exige a cada fiel uma adesão sem reservas, mesmo que para isso tenham de executar as tarefas mais arriscadas, para as quais pareceria haver outros melhor qualificados:

  • nesta cena de David e Golias, o mais jovem tomou o lugar dos mais velhos na defesa do seu povo;
  • na cena de Judite e Holoferne, reproduzida noutro "post", foi uma mulher a fazê-lo em vez dos homens, liquidando o tirano.

O PAPEL DRAMÁTICO DA LUZ

Um foco de luz intensa incide nos elementos mais dramáticos das cenas e faz mergulhar na penumbra tudo o resto.


Este violento claro-escuro é uma marca poderosa do Barroco.

No tempo de Vieira


No tempo de Vieira